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Adolescentes à Deriva

  • Angelo A. Lopes
  • 27 de jun.
  • 5 min de leitura

Nos dias de hoje, muitas famílias se veem dilaceradas por um turbilhão de questões emocionais que, por vezes, parecem intransponíveis. O crescente distanciamento entre pais e filhos adolescentes, a falta de comunicação genuína e a busca incessante por gratificação imediata, que se manifesta em atividades como jogos, redes sociais ou consumo excessivo, são sintomas de um vazio emocional profundo. Para os pais, a angústia é real: “Onde foi que eu errei?” Muitos se perguntam, sem encontrar respostas claras, enquanto tentam preencher esse vazio com presentes ou experiências materiais, sem se dar conta de que o que falta não pode ser suprido por essas ações.


A Angústia da Falta de Vínculo Real


Na prática clínica, é cada vez mais frequente observar que, por trás das atitudes revoltadas ou apáticas dos adolescentes, há uma dor silenciosa: a dor da desconexão. Conectados o tempo todo aos seus dispositivos, mas distantes emocionalmente daqueles que mais deveriam ser seus pontos de apoio — os pais. Essa desconexão é alimentada pela falta de tempo real, de diálogo, de momentos que vão além da troca material. A verdadeira presença — aquela que vai além da física, mas que se traduz na atenção plena, na escuta e no afeto — é muitas vezes substituída por telas e pela ilusão do prazer imediato. Esse vazio não é algo trivial. Ele se manifesta em forma de desânimo, frustração, agressividade e, o mais alarmante, um crescente desinteresse pela vida. "Se nada parece ter sentido, por que continuar?"


É fundamental compreender que o vínculo afetivo genuíno não nasce de uma relação superficial ou de um carinho desprovido de limites. Ele precisa ser construído com presença, dedicação e, acima de tudo, pela capacidade de sustentar o "não". Essa ausência de limites afeta profundamente o adolescente, pois o que ele mais necessita, paradoxalmente, é a experiência da frustração — a vivência de que nem sempre os desejos podem ser atendidos de imediato. Esse limite é essencial para a construção de um ego forte, capaz de lidar com os desafios do mundo real.


O Desafio de Lidar com a Frustração: A Construção do Ego e a Necessidade de Limites


O que está em jogo aqui não é apenas o comportamento do adolescente, mas o desenvolvimento emocional e psíquico dele. O adolescente, sem os limites necessários, se vê diante de um mundo onde tudo é possível e rápido, mas onde a verdadeira construção de caráter e identidade fica comprometida. Ao não saber lidar com a frustração, com a espera e com a dor da ausência, ele se vê constantemente em busca de uma solução rápida, seja nas redes sociais, nas compras ou em qualquer forma de prazer imediato.


Para o desenvolvimento psíquico saudável, a frustração tem um papel essencial: ela permite que o adolescente desenvolva resiliência, paciência e, acima de tudo, uma capacidade real de autocontrole. Quando os pais falham em oferecer esse limite — seja por medo de "não agradar", seja pela insegurança quanto ao papel de autoridade — o adolescente fica perdido, sem saber como se situar no mundo.


A frustração e o limite, longe de serem considerados punições, devem ser vistos como gestos de amor. Eles oferecem o terreno fértil para o desenvolvimento da autonomia emocional e para o fortalecimento do ego. Esse processo de amadurecimento é o que permitirá ao jovem, mais tarde, lidar com as exigências do mundo adulto de maneira saudável.


A Urgência de Ações Concretas: O Papel Transformador da Psicoterapia


Quando abordamos o sofrimento dos adolescentes, não se trata de um mero problema comportamental, mas de um distúrbio na própria dinâmica emocional familiar. Como psicoterapeutas, sabemos que o trabalho não é apenas com o adolescente, mas com toda a família. E esse processo exige ações concretas, a começar pela reconstrução do vínculo.


  1. Reconstrução do Vínculo Emocional: Para que uma relação genuína de confiança e afeto seja retomada, é preciso que os pais se disponham a ir além da troca de bens materiais e possam estar presentes emocionalmente. Isso significa reservar tempo para estar com os filhos, escutá-los de verdade e criar espaços para que o diálogo flua, sem pressões externas. A presença física sozinha não basta; ela precisa ser acompanhada pela escuta ativa e pela empatia. O vínculo só é possível quando ambos, pais e filhos, estão emocionalmente disponíveis um para o outro.


  2. Estabelecimento de Limites Saudáveis: A psicoterapia também pode ser crucial para ajudar os pais a entenderem a função dos limites. A autoridade amorosa precisa ser restaurada. Pais não devem ser amigos de seus filhos, mas sim figuras de autoridade que, por meio do afeto, ensinam o que é certo e errado. Isso inclui não só dar amor e acolhimento, mas também impor restrições necessárias para o desenvolvimento do caráter e da autonomia do jovem.


  3. Elaboração das Angústias dos Pais: A angústia de não saber como lidar com um filho que parece distante ou agressivo é uma realidade que muitos pais enfrentam. Por isso, é essencial que, ao procurar a psicoterapia, os pais também possam elaborar suas próprias inseguranças, medos e frustrações. Entender o papel do limite, aceitar que os filhos têm suas próprias angústias e, muitas vezes, aprender a lidar com a culpa, é um passo fundamental para se tornar uma figura de autoridade emocionalmente saudável e equilibrada.


  4. Fortalecimento dos Recursos Emocionais da Família: A psicoterapia oferece um espaço seguro onde os membros da família podem compartilhar suas emoções, elaborar suas angústias e encontrar maneiras de fortalecer seus recursos emocionais. Isso não só ajuda os pais a se tornarem mais presentes, mas também permite que os adolescentes se sintam mais confiantes e acolhidos em suas vulnerabilidades.


A Transformação Através da Psicoterapia: Um Processo de Autocuidado


É importante deixar claro que a psicoterapia não oferece soluções rápidas. Não se trata de um passe de mágica que vai transformar os adolescentes em jovens bem comportados, mas de um processo profundo de reflexão, escuta e acolhimento. O objetivo é ajudar os pais e os filhos a se reconectarem, a desenvolverem uma comunicação mais saudável e a fortalecerem os laços emocionais, oferecendo ferramentas para lidar com os desafios da vida cotidiana.


Esse é um processo de transformação que envolve todos os membros da família. Ao cuidar do vínculo, você não só cuida do outro, mas também de si mesmo. Ao estabelecer limites saudáveis, você ensina seu filho a lidar com o mundo de forma mais autêntica e responsável. E, ao estar presente — não apenas fisicamente, mas emocionalmente — você oferece o que é mais importante para um adolescente: a certeza de que, apesar de todas as dificuldades, ele não está sozinho.


Conclusão: O Caminho Para a Reconexão


Se você se reconhece nesse cenário e percebe que há dificuldades na relação com seus filhos, na construção de limites ou na comunicação afetiva, a psicoterapia pode ser a chave para transformar essa realidade. É possível, sim, restaurar o vínculo, estabelecer limites saudáveis e trazer de volta a presença emocional que tanto falta.


Resgatar o vínculo é cuidar da saúde psíquica de toda a família, proporcionando aos seus filhos a base emocional necessária para se tornarem adultos equilibrados, responsáveis e conectados com o próprio eu.

 

 
 
 

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Clínica Iluminare Psicologia

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